À espera (ou mini-ensaio sobre a aceitação) | Waiting (or mini-essay about accepting)


Há uns tempos atrás cruzei-me com uma peça de Samuel Becket: "À espera de Godot". E a verdade é que durante toda a peça, mesmo apesar da promessa, Godot nunca vem.

Dei comigo a pensar na quantidade de coisas pelas quais esperamos e que nunca chegam ("we too are expecting for something that never arrives"). Esperamos ter mais tempo, mais dinheiro, um emprego melhor, ser mais saudáveis, uma oportunidade para mudar de vida, o companheiro perfeito.

Porque será que nos custa tanto aceitar? Não digo resignar-nos - isso nunca!! Mas aceitar...
aceitar que coisas más acontecem a pessoas boas
aceitar que a vida é impermanente, imperfeita e incompleta
e respeitar e apreciar essa impermanência, imperfeição e estado incompleto

Desde que cheguei à Austrália tenho aprendido bastante acerca do papel da "aceitação" na filosofia Budista:
  • aceitar que o sofrimento e a insatisfação existem para todos 
  • aceitar que o sofrimento e a insatisfação são causados por não conseguirmos alcançar os nossos desejos e aspirações 
  • aceitar que podemos gerir o sofrimento e a insatisfação, gerindo os nossos desejos (aka gestão de expectativas) 
  • objetivo: libertar-nos do grilhão dos nossos desejos que tanto sofrimento nos trazem 
Aceitar em vez de tentar controlar algo que nos traz sofrimento - quando nada podemos fazer acerca do mesmo - é um exercício duro, é um facto. Mas ao mesmo tempo bastante libertador: afinal aceitar é honrar o que sentimos sobre o que está a acontecer.

A verdade é que nem tudo tem corrido exatamente como eu desejaria aqui por Melbourne - nomeadamente a questão de encontrar trabalho. Obviamente é uma situação que me foge ao controlo e que me chateia - uns dias mais que outros. Podia ter deprimido e desistido; podia ter criado a ilusão de que estava tudo perfeito mesmo assim. Mas não: decidi aceitar e viver com isso. Sim, continuo a procurar emprego, mas enquanto o faço descobri em mim outras coisas que me fazem sentir útil e motivada, nomeadamente o meu trabalho na Cruz Vermelha e muito em breve na Learning Laneway (para além de ter descoberto que me safo mesmo muito bem na cozinha!).

Em vez de "esperar" (e desesperar...), é este o exercício que tenho vindo a tentar fazer:
ser flexível
estar aberta aos outros e ao mundo
aprender a apreciar as pequenas (grandes) coisas

E isto não tem preço.

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